A Síndrome da Boazinha
Somos educadas assim: seja boazinha. Ou “se você for boazinha mamãe deixa você brincar lá fora” e tantas outras frases que, no final das contas, nos mostram um caminho perigoso: o de ser uma boazinha.
Se não há uma causalidade direta e clara entre nossos atos e as consequências, o que aprendemos com essas pequenas chantagens quando somos crianças?
Essa dinâmica nociva gera uma ansiedade imensa: se você errar em algum ponto aleatório da vida, não é mais uma boa menina e não é mais merecedora – seja lá do que for. Uma sensação que, como tudo que nosso inconsciente guarda, fica ditando comportamentos por anos e anos sem que a gente perceba!
O sacrifício ainda é muito valorizado – como se fosse digno somente aquele que padece, dá a última gotinha de sangue, definha, sofre, vira a madrugada trabalhando, compreende as babaquices dos amigos sem nunca reclamar.
Mas a Boazinha é mais do que apenas alguém passivo e sofredor, não é apenas aceitar os infortúnios – mas buscar servir, salvar o mundo, resolver os problemas que não são dela, ouvir desabafos (sem quase nunca ser ouvida), ser agradável, útil, impecável. É a compulsão por agradar. E tudo isso porque ela precisa desesperadamente de validação.
Como muito bem definiu Kay Redfield Jamison, autora de Uma Mente Inquieta: “você tem dificuldade para perceber a diferença entre os próprios desejos e as exigências dos outros” e isso, é claro, impede que viva a sua verdade, que seja você mesmo. E nós sabemos: Você precisa de Você!
Algumas características das Boazinhas:
- precisa ser amada e validada por todos que conhece
- foge de conflitos tanto quanto pode
- suas necessidades são guardadas num cantinho para priorizar as necessidades de quem ela ama
- faz sempre muitas coisas para os outros e é usada pelas outras pessoas em muitas situações
- necessidade da aprovação dos outros
- precisa ser “precisada”
- quase nunca enfrenta outras pessoas – nem mesmo para se proteger
- em qualquer sinal de conflito fica muito mal – às vezes até fisicamente
- não consegue decepcionar a expectativa de outras pessoas, mesmo que tenha que se sacrificar
- imensa dificuldade em dizer qualquer coisa que possa fazer outra pessoa fique desconfortável ou com raiva
- dificuldade em delegar
- resistência em dizer não
- sente incômodo ao receber gentilezas
- usa a bondade como escudo emocional – fazem qualquer coisa para não ter nenhum tipo de desgaste, aborrecimento, desaprovação.
- quando tem alguém próximo irritado ou triste acha que é algo com ela ou tenta resolver
- apesar de ser extremamente benevolente com os outros é ferozmente autocrítica.
Se identificou? Não se culpe!
Todas nós podemos passar – em diferentes intensidades – por essas armadilhas. Isso vem de uma cultura muito enraizada e tóxica de que precisamos ser boas meninas.
Obviamente esses comportamentos têm consequências negativas para nossa vida. Quanto mais tentamos agradar – ao invés de sermos nós mesmas – mais nos tornaremos incomodadas, inseguras e medrosas. Nossa energia é sugada e nos sentimos ocas e exaustas.
A constante autocrítica e preocupação com tudo perfeito, aprazível, gentil, simpático, encantador e as necessidades e desejos dos outros perfeitamente atendidas, faz com a que a Boazinha esteja sempre infeliz e ansiosa.
Viver assim é sustentável? Não, mas muitas toleram por muito tempo, completamente desconectadas de si mesmas.
Sou Boazinha. E agora?
A boa notícia é que é possível mudar – SEMPRE é! O primeiro passo, claro, é se conhecer. Saber o que é seu, o que deseja, quem é em essência, quais são suas prioridades. Outro passo importante é aceitar que não precisa ser unanimidade ou ser amada por todos, e até mesmo os que amamos e que nos amam de verdade podem discordar, ouvir e dizer nãos e manter um relacionamento equânime e saudável.
Livre-se da Boazinha que habita em você – ela pode ser cruel e ferir. É um processo de descobertas, erros e acertos e é preciso estar sempre atenta para não permitir recaídas – mas vale o esforço: seja livre e leve para ser você!

